Diário de campo - 14/12/14




14/12/2014 – A noite de sábado, com o céu carregado de nuvens e relâmpagos, não era animadora para quem estava se preparando para descer a serra na madrugada de domingo. Entretanto, após uma noite com poucas horas de sono, o alarme avisava que eram 4h05min. Sem hesitação comecei a reunir as coisas, já separadas anteriormente, para sair. Estava atrasado, restando uma única opção, ligar avisando o Kauê (Biólogo-mestrando, que faz pesquisas com felinos) que não ia conseguir pegá-lo no horário combinado. 



Depois de encontrar o Kauê, deslocamo-nos para Santa Felicidade, onde iramos encontrar o Jardel Roscamp (Professor e Pastor da Primeira IEQ).
Equipe reunida e feita as apresentações, seguimos para Morretes pela Rodovia 277 e posteriormente pela Estrada da Candonga, onde uma pavimentação nova em folha fez sentir que estávamos andando sobre um tapete. No entanto, quando o asfalto terminou começamos a sacolejar de tal maneira que o Jardel se viu embalado em um sono, como uma criança.



Conforme avançávamos a paisagem foi se alterando gradativamente, passando de uma vegetação alterada para uma mata secundária. Havia sinais nítidos das chuvas que caíram nos últimos dias, pelas condições da estrada e a presença de algumas árvores caídas. Primeiro foi uma embaúba atravessada, que retiramos facilmente com as mãos. Porém, na segunda não houve jeito a não ser deixarmos o veículo e continuar a pé.



Antes, aproveitamos para fazermos um rápido desjejum, constituído de pão com mussarela, algumas frutas e COCA-COLA. Assim, que queremos perder a barriga...
Percorremos uns 300metros até chegarmos ao Rio Lajeado, onde tivemos que entrar na água para cruzá-lo. Nestas alturas, o Kauê já ficara para trás, pois saía da estrada para entrar na mata em busca de sinais da presença de felinos, onças principalmente (pintada e parda). Assim, somente eu e o Jardel prosseguíamos juntos.
Cruzamos um segundo rio, onde deparamo-nos com o Sr. Rogério, que nos deu algumas informações. Posteriormente chegamos as margens do Rio Canasvieiras, encontrando uma ponte pênsil para atravessá-lo (foto).


O local que chegamos tinha algumas construções em madeira (casa, barracão, galinheiro), todas bem cuidadas, assim como o gramado aparado. Diferente daquilo que imaginei olhando as imagens de satélite, não havia um bananal, mas uma plantação de pupunha (Bactris gasipaes) naquela área. Tudo muito bonito, mas ainda faltava o que queria, um ponto elevado com boa vista da vegetação ao redor.  Vimos um caminho entre a plantação que parecia levar para um lugar mais alto. Seguimos e aos poucos íamos subindo, quando virei, fiquei maravilhado com a paisagem, cadeias de montanhas para todos os lados. Estavam encobertas pelas nuvens baixas, mas eram visíveis (infelizmente a foto não capta as montanhas ao fundo). 

Ficamos posicionados de frente para o Sudoeste, deixando nas nossas costas uma vegetação alta com árvores chegando aos 20metros, onde um grupo grande de periquitos-ricos (Brotegeris tirica) emitiam seus gritos estridentes, numa verdadeira algazarra. 
Expliquei ao Jardel que precisava de locais como aquele, com ampla visão, e então, era hora de esperar na esperança que algum gavião aparecesse. Mais do que isto, esperava que o céu limpasse e me permitisse ver melhor toda a região. No entanto, a situação parecia que ia piorar. Começou uma leve garoa que em certos momentos se intensificou.

Enquanto contava meu testemunho com as aves de rapina no Japão (açores – Accipiter gentilis), o Jardel, virando-se para o lado Sudeste, falou: - Douglas, e o que é aquilo?
No momento em que ele falava, já estava escutando um alarme muito grande dos periquitos-ricos. Ao virar e olhar para cima, observei um gavião-pato (Spizaetus melanoleucus) indo de Sudoeste para Sudeste, pouco acima das copas. Os periquitos-ricos voavam agrupados descrevendo círculos.
Na narração do Jardel, eles perseguiam o gavião. Entretanto, aquele balé, pareceu-me mais uma forma de atordoar o predador para dificultar-lhe a captura. Mas escutei atentamente a narrativa do Jardel, que avistou primeiro o gavião: - O gavião veio voando baixo (Sudeste-Sudoeste) e os periquitos levantaram vôo, saindo atrás do gavião. Automaticamente, lembrei-me da foto do Leonardo Patrial, tirada em 16/05/2010, em Itacará – BA, publicada no Wikiaves, onde um gavião-pato persegue um grupo de Eupsittula aurea (periquito-rei). Willis (1988), também descreveu ter observado um gavião-pato mergulhando sobre um bando de Diopsittaca nobilis (maracanã-pequena), na Estação Ecológica da Serra das Araras – MT, em 27/jul/1987. Todas estas observações sugerem que Spizaetus melanoleucus tenha uma inclinação em caçar os psittacídeos (entre os psittacídeos, encontramos, araras, papagaios, baitacas, periquitos e etc.) de pequeno e médio porte.
O gavião, retirou-se de nossa vista, mas ainda o veríamos entre as 10h00-10h10 min. sobrevoando em círculos acompanhado de um gavião-tesoura (Elanoides forficatus). Sumiu, dirigindo-se para Sudeste direção de onde fez sua primeira aparição.
Este indivíduo pode ser um daqueles observados anteriormente, por mim, William Menq e Jessica Moraes do Nascimento. 

O dia estava ganho, mas havia de vir mais, através de informações sobre um ninho de gavião-de-penacho (Spizaetus ornatus) e outros locais de sua ocorrência.



Voltamos a encontrar o Sr. Rogério, caseiro daquela propriedade onde estávamos. Entre as coisas que nos falou, uma chamou minha atenção, o fato de poder pegar cascudos com as mãos debaixo das pedras do Rio Canasvieiras.  Meu pai contou que fazia isto, quando ia ao Rio Laranjinha nas cercanias de Bandeirantes e Santa Maria, norte do Paraná. Embora muitos ainda pesquem no rio Laranjinha, hoje, ninguém acreditaria que alguém pudesse pegar cascudos com as mãos em suas águas.

Quanto aos gaviões, o Sr. Rogério não mostrou ser a pessoa ideal para obter informações. Por quê? Porque, disse que o único gavião grande (branco) que freqüentava a área foi observado por ele, cerca de dois anos atrás. Mas em duas horas que passamos naquele local, vimos um gavião-pato. Minha conclusão é que o Sr. Rogério não é o tipo de pessoa que costuma prestar atenção no que está voando.
Hora de voltar, encontramos o Kauê, parado no meio da estrada, conversando com um funcionário da Copel (Genilson). Também, com um grupo de jipeiros, que arrastaram parcialmente o tronco de árvore que impediu nossa progressão com o Fiesta, ao chegarmos.
Após mais de 1 hora, chegamos ao centro de Morretes, onde comemos no restaurante Rota do Sol. Indico o restaurante para quem quiser comer sem pagar o valor exorbitante dos locais tradicionais. Com R$ 26,90 é possível comer a vontade do Buffet, que serve camarão frito, peixe, pirão de peixe, carne de frango, almôndegas, saldas, arrroz, macarrão, feijão, etc.
Nossa próxima parada foi à feirinha, que oferece vários produtos artesanais produzidos no município. A praça central, a beira do Rio Nhundiaquara, estava com os Flamboyant (Delonix regia) floridos, embelezando o clima pitoresco da cidade. 

Retornando ao assunto principal, depois de saborearmos um sorvete de gengibre (produto local) fomos conversar com o Sr. Jorge. Inicialmente, porque ele avistou uma onça parda (Puma concolor), também conhecida pelos nomes de suçuarana e puma, no dia 6 de dezembro.
Quando perguntei sobre gaviões grandes, o Sr. Jorge, respondeu logo: - Tem o penacho, neste local da onça, também. Inclusive, no ano passado tinha um ninho dele na propriedade ...
Fui pegar algumas fotos, para verificar se o gavião que estávamos falando, tratava-se mesmo do Spizaetus ornatus. Confirmado pelo Sr. Jorge, ele passou a descrever alguns comportamentos de forrageamento, que ouvi o Sr. D (caçador, mencionado no diário do dia 07/12/14) falar, além de uma terceira pessoa (entrevistado na Estrada da Limeira). Incrível, se realmente é o gavião-de-penacho, ele está se beneficiando de uma atividade humana!???
Vou registrar narrativas passadas.

Antes de encontrar o S. ornatus, na Fazenda São João do Bom Retiro, município de Abelardo Luz – SC (1999), um dos funcionários da fazenda, contou a respeito de um gavião marrom, grande, bravo, que ficava na borda da mata onde se lançava atrás de pombões (Patagioenas picazuro). Na mesma época, Cassiano Fadel Ribas (com. pess.) mencionou história semelhante contada por funcionários e proprietários do município de Sengés – PR. O S. ornatus, simplesmente fazendo caça de espera, na borda da mata.
O mesmo estará ocorrendo em Morretes? Porém, com um diferencial que será acrescido, assim que eu confirmar a presença do gavião-de-penacho, nas áreas mencionadas e talvez o mais importante, conseguir um registro fotográfico deste comportamento.
Com as palavras do Sr. Jorge, que ficou de conversar com um dos responsáveis da área onde ocorreu a nidificação do S. ornatus, para obtenção de permissão de entrada, terminei o dia com um sorriso interior.

Final de mais uma fase de reconhecimento, agradeço aos amigos Jardel Roscamp e Kauê Cachuba de Abreu, pela companhia. Posso dizer que o Jardel obteve seu batismo em hawkwatching, com chave de ouro, localizou um gavião-pato (Spizaetus melanoleucus). Acrescento que muitos ornitólogos, ainda não tiveram o privilégio de ver está espécie voando livre na natureza.
Abraços aos irmãos e irmãs, da Primeira IEQ que encontramos em Morretes. Também, meus agradecimentos a Iara, que fez a apresentação do Sr. Jorge. Obrigado!
JESUS, OBRIGADO! Por mais um dia empolgante, depois de uma semana atarefada no trabalho. Certamente as forças foram renovadas! Obrigado, pela proteção, por nos livrar de acidentes ou infortúnios que pudessem estragar a alegria deste dia.



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